E se...

18:17 Marioski - Mario Santos 1 Comments




Por várias vezes, quando estou parado junto a um semáforo, penso “E se não tivesse parado aqui e passado o vermelho? Onde estaria agora? Que mudanças implicaria na minha vida?”
Este assunto sempre me cativou, fazendo-me pensar de vez enquanto no “e se...”
Quantos “e se…” já evitámos na vida, sem saber se nos levava a um caminho melhor?
Porque não arriscamos quando temos a oportunidade de decidir “ e se eu fosse por ali? “.
De vez enquanto é a própria vida que nos coloca esses “ses” sem a nossa interferência, mas que nos leva a novos caminhos. Pensem nisso.
O
brigado por lerem.


E se…

São 6 da tarde e o dia está lindo. A Primavera chegou, o sol brilha no horizonte e a temperatura está agradável. O que continua igual, seja qual for a estação do ano é o tráfego naquela avenida em que Miguel se encontra e a tem de a fazer todos os dias da semana, com filas intermináveis de carros, camionetas e autocarros, que também eles, tentam desesperadamente chegar ao lar doce lar.
Miguel bate com as mãos no volante, tentando seguir o compasso da música que está a ouvir na rádio. Assim não se enerva tanto com os mais variadíssimos episódios que diariamente lhe passam à sua frente.
Distraído, mas não tanto que não repare na imagem refletida no seu retrovisor. Uma linda mulher, na casa dos 22/23 anos, conduz um pequeno carro de cor garrida. 

De cabelos pretos e longos, óculos de sol enormes e ao que parecia, uma blusa azul-escura, estava a conseguir chamar a sua atenção e a de outros condutores.
Ela não parece ligar, parecendo até divertida com a situação. Dirige com o braço apoiado na porta do carro e de vidro aberto, o que provoca que o seu cabelo ondule na leve brisa que se faz sentir, atraindo assim ainda mais a atenção.
Miguel sorri, imaginando passear com ela pela praia, dançar, falar …
Beeepeee, beeepeee, beeepeee
Miguel acorda para a realidade e tudo que estava a pensar de bom daquela mulher, ficou por ali mesmo.


- Ok.....ok.... puxa... foste feita com a mão na buzina ou quê!!!!!! Já vai... porra!!! - pragueja Miguel em voz alta.

Engata a primeira, avança mais uns metros ficando um pouco mais perto de um cruzamento onde semáforos controlam o trânsito.
Continua a praguejar para si... e pensa... “que mulher mais estúpida... epá foi só uns segundos e beepee beepee ... tá com pressa a mulher... eu dou-lhe a pressa... devias era ter um furo... ficavas aí a tarde toda... ”
O semáforo passa a verde e todos se apressam a tentar passar. Miguel também.
O tempo vai escasseando e o amarelo cai. Quando ainda tem uns carros à sua frente, começa a pensar que ainda não será desta vez que conseguirá passar.

- Vá andem lá com isso.... querem ver que não vou conseguir passar? Porra!!!

O sinal passa a vermelho e Miguel numa tentativa de conseguir passar para o outro lado do cruzamento, acelera bruscamente fazendo chiar os pneus. Do outro lado, já veem carros na sua direcção e pensa que não vai conseguir. Prego a fundo e lá consegue mesmo à justa mas com algum prejuízo para ele. O piso da estrada, parecia que tinha sido pintando com borracha dos pneus, tal o rasto lá deixado. Os automobilistas que se cruzam com ele, ainda apitam, chamando a sua atenção pela manobra perigosa, que acabara de fazer.
Olha para o retrovisor, tentando verificar se também ela tinha  conseguido passar. Não passou. Sorriu de um modo malandro.

-“Vá, agora quero ver a tua pressa. Buzina, buzina...pode ser que te ajude hehehehheh” - pensa Miguel.

Passados 30 minutos,
Miguel chega à sua rua e após estacionar, dirige-se ao velho prédio onde mora. Vagarosamente vai subindo pelas escadas até ao terceiro andar. Abre a porta e larga a mala do portátil junto à mesma, entrando de seguida na sala. Senta-se de imediato no sofá como se estivesse farto daquela vida sem emoção, sem…nada. Agarra no comando da tv e liga-a. Vai passando de canal em canal até que se fixa num de desporto. Estende-se ao cumprido e assim fica.

- Miguel és tu? - ouve-se dentro da casa.
- Sim Mãe.
- Então esse dia?
- Ha.... passou-se. Igual ao de ontem.... sem novidades.
- O jantar está quase pronto... tens empadão...
- Ok... mãe...

Miguel não voltou a pensar nunca mais na vida sobre aquele pequeno incidente.



A mesma história mas Miguel travou…

O sinal passa a vermelho e Miguel numa tentativa de conseguir passar para o outro lado do cruzamento, acelera bruscamente fazendo chiar os pneus. Do outro lado, já veem carros na sua direcção e pensa que não vai conseguir.
Toma uma decisão! Trava a fundo! 
Sente-se aliviado ao ver os carros passarem fazendo tangente ao seu, mas por outro lado, não entende bem o porquê de ter travado, já que gostava de acelerar. Quando pensa que tudo já passou, o seu corpo é repentinamente projectado para frente com alguma violência, seguindo-se um barulho enorme de chapa a amolgar e vidros a partirem-se. O seu carro, avança uns metros para a frente tal a violência do embate. O carro que vinha atrás, batera-lhe. Miguel olha para o retrovisor e vê a linda mulher a gesticular gestos pouco agradáveis. 

“Estavas mesmo com pressa. Ora vamos lá ter uma conversazinha. Isto promete. heheheh” – Pensa Miguel.

De repente, o seu instinto obriga-o a olhar para o seu lado esquerdo, ficando como que paralisado. Fecha os olhos com força e agarra-se firmemente ao volante. Espera pelo embate do carro que se aproxima muito rapidamente, fazendo parecer aqueles
milésimos de segundo em horas. Apesar do outro condutor já estar a travar a fundo, numa tentativa desesperada de impedir o acidente, o inevitável acontece. Miguel apenas se lembra, de voltar a ouvir vidros a partirem-se, chapa a amolgar e o característico barulho de pneus a chiar. 

-Sr..... sr.... está bem...???

Miguel começa a ouvir ao longe alguém como se lhe estivesse a gritar. Ouve sirenes e sente o seu corpo a baloiçar um pouco.
Abre os olhos devagar e apesar de não conseguir ver com nitidez, apercebe-se que uma mulher está junto dele. Era do INEM. Olha com mais atenção e repara que está numa maca dentro de uma ambulância.

- O Sr. está a ouvir-me? Como se chama? Sabe o seu nome? - Pergunta a mulher.

Miguel começa a ver com alguma nitidez o rosto da mulher do INEM e quando ela se próxima da sua face, algo acontece naquele momento. Sem saber bem o porquê, sentiu que tinha de lhe falar.

-“É linda.... lindíssima... queres saber o meu nome? Miguel... e o teu?” – Miguel pensa, mas não consegue dizer nada. As dores começam a ser mais reais e os pormenores do acidente também.
- Olá... então já me sabe dizer o seu nome? Não sei se tem consciência disso, mas teve um acidente  e estamos a caminho do hospital. Não parece ser nada de grave, esteja descansado. – Diz a mulher numa tentativa de acalmar Miguel.
- Olá... - diz Miguel com uma voz trémula - Chamo-me Miguel .... e tu? 

- Carla...
- Olá Carla.... bom ... deve ser do acidente... mas és muito bonita.

Carla cora um pouco. Não estava habituada a ouvir piropos quando transportava doentes, mas aquele, deixou-a um pouco pensativa e com uma sensação estranha mas agradável.

- Vá tenha calma... deve ter alguns ossos partidos e teve perda de consciência, por isso...
- haaa ... sim.... sinto algumas dores.


Miguel não conseguiu desviar os olhos de Carla. O seu sorriso não deixava. Tinha cabelos acastanhados, olhos igualmente castanhos, e pelas pequenas bochechas, tamanho do peito e braços, apercebe-se que Carla tem uns quilitos a mais, mas não ligou a isso, apenas reparou no seu lindo sorriso lhe transmitia algo inexplicável e o brilho dos seus olhos, uma alegria verdadeira. 
Sem saber bem porquê, Miguel volta a tentar falar com ela apesar das dores.

- Obrigado pela companhia.... olha... podemos ir beber um copo depois ... ai...aaaaiiii... de ficar ok?
- Claro ... pois sim... claro que sim... – Responde timidamente Carla.
Sorriem um para o outro e lá continuam na viagem até ao hospital.
Fim

Mário Santos - Ficção

1 comentário: